Minha tia Zula me salvou algumas vezes na vida. Na escola, principalmente.
Eu era o nerd da classe, o que só tirava dez. Aquela situação chegava a ser constrangedora. Então, uma vez, os professores promoveram um concurso de receitas. A melhor receita levaria um ponto positivo na nota. Foi um furor, principalmente entre as meninas. Cheguei a ouvir que daquela vez eu não tinha chance.
Sem saber bulhufas de culinária, recorri à tia Zula, exímia doceira. Ela não hesitou e passou para mim a sua receita de gelatina com abacaxi.
Não botei muita fé. Nunca fui muito fã de frutas, quanto mais o abacaxi.
Lembro que a parede da sala ficou forrada de receitas. Eu via tudo aquilo e tinha certeza que a receita da minha tia ninguém iria ver naquele verdadeiro cardápio variado.
No dia da revelação do resultado, para meu espanto e de todo mundo, a professora disse que a receita vencedora foi a da Gelatina com Abacaxi. Ouvi protestos e reclamações. “Até na receita ele vai ganhar?”. A professora justificou que a comissão achou muito interessante a novidade e a combinação de sabores.
Numa outra vez, a professora de Artes, o meu terrível ponto fraco, passou um trabalho para as férias de julho: montar uma cestinha de cartolina, nos moldes que ela fornecia.
Passei as férias todas tentando montar aquela cesta. Não conseguia de jeito nenhum. Minha mãe não conseguiu. Minha prima não conseguiu. Ninguém conseguia. Corri para a tia Zula. Mas, ela também não conseguiu. Mas, pelo menos, montou alguma coisa estrambótica que chamamos de cesta.
No dia da volta às aulas, no portão da escola, as meninas desfilavam suas cestinhas encantadoras, frágeis e dignas de uma exposição de artesanato. Eu, morrendo de vergonha, tentava esconder minha cesta esquisita, desengonçada e toda torta.
Na avaliação, as meninas enfeitavam a mesa da professora com suas cestas sublimes, perfeitas e encantadoras. Eu levei a minha e nem quis olhar para a cara da professora. Ouvia risos pelo corredor da sala.
Ao final, a professora proclamou o resultado. O Gilberto venceu!
Protestos efusivos e mais que justos despencaram pela classe. A professora não se abalou e simplesmente justificou:
— Pelo menos foi ele que fez!
Naquele momento, só agradeci minha tia Zula. Tão maravilhosa em suas habilidades tanto no doce quanto nos meus abacaxis!
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