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HINO AO AMOR


Quem não se emocionou com a apresentação de Celine Dion cantando Hymne à L´Amour no encerramento da cerimônia de abertura das olimpíadas deste ano.

Lutando contra uma doença incapacitante, sua interpretação rasgou os limites da doença, desafiou a finitude e erigiu um marco à superação e um hino ao amor.


Interessante que, assim como Celine teve um grande amor perdido em sua vida, muitas outras célebres intérpretes da canção como Edith Piaf, Dalva de Oliveira, Maysa e Vanusa também reverenciaram o hino ao amor de suas vidas. Para Dalva, a nossa Edith Piaf, por exemplo, quanto mais sofrida a música, mais linda ficava sua voz cortante.


Assim como Piaf, ambas marcaram a música com suas interpretações angustiantes, ambas pobres na infância e envoltas em inúmeros romances conturbados. Suas performances musicais, suas vidas e tragédias, vincularam Edith Piaf à alma da França e tornaram Dalva de Oliveira o retrato de uma época no Brasil.


Curioso que todas elas se destacaram cantando o Hino ao Amor, uma letra muito forte para o estado de saúde delas. Assim, como, agora Celine Dion.


Gosto da versão que Dalva cantava. “Se o azul do céu escurecer e a alegria da terra fenecer, não importa, querido, viverei o nosso amor”. Quantos corações enterneceu a partir das ondas da Rádio Nacional, nos anos 50, 60. Quantas lamentações espalhou por vidas ressentidas que lamentavam não terem feito tudo por seu amor.


O amor decantado que imagina ser forte o suficiente para sobreviver no céu ante o amor de Deus e o cuidado dos anjos. Forte o suficiente para, sem nenhuma dúvida, crer que atrairá para si o grande amor perdido na terra para vivê-lo, finalmente, eternamente.


Quantos casamentos receberam suas noivas ao som do Hino ao Amor. Quantos corredores de hospitais gritaram o Hino ao Amor no momento da despedida. Quantas lápides cobriram esquifes baixadas aos gritos do hino ao amor.


Em tempos conturbados, de esfriamento do amor e exaltação a discursos de intolerância e ódio, onde o deboche, preconceito e o desdém reduzem o amor ao tradicionalismo, ao finito, ao hermético, a uma foto em família no instagram, ao convencional, ao medo medindo toda forma de amor, o segundo hino francês Hymne a l´amour, na exuberante voz de Celine Dion ressoando pelo mundo a partir das ondas da Torre Eiffel, não deixou de ser uma súplica, um clamor para o despertar dos homens e mulheres desse tempo.


Tocado pela apresentação de Celine, busquei com avidez pela internet, jornais e comentários, celebrações ao amor. Algumas eu encontrei. Mas, encontrei muita gente questionando se a interpretação de Celine não era fake, dublagem ou playback.


Assim como me deparei com tantos comentários raivosos, irados por uma dita hipocrisia dos organizadores do show de abertura das olimpíadas que, a estes olhares obtusos, passaram todo o tempo ofendendo religiões, exaltando amores não convencionais, inventando liberdade e fraternidade quando o sistema tirava a tal liberdade para ofender e odiar o próximo e dificultava a fraternidade entre os iguais, entre as maiorias superiores.


Vivemos tempos de proibição ao amor pelo planeta. Defender florestas, rios e os nossos ares é motivo de ódio. Defender a paz e o convívio entre os povos é motivo de ira bíblica. Aceitar toda forma de amor é visto como ato devasso e contrário aos bons costumes. Mesmo o hino ao amor, de natureza tão transcendente, é encaixotado em embalagens. A minha forma de amar deve se sobrepor à sua forma de amar. A minha forma de amar não aceita a sua forma de amar.


Voltando aos hinos de amor tão decantados por Piaf, Dalva de Oliveira, Maísa, em suas vidas sofridas, conturbadas e cheias de amores proibidos, revelados e sobrevividos ainda tão fortes mesmo após as perdas, eu fico pensando para quem eu erigiria meu hino ao amor.


Lembro de entes e pessoas queridas que já se foram. Minha mãe que faria aniversário essa semana e que tanto mais amor eu poderia ter oferecido a ela. E fico especulando se estou reverenciando, cuidando e amando o meu amor, o amor que recebo hoje, na intensidade merecida. Antes que eu venha a declamar meu hino ao amor somente após o seu peso ser revelado naquele instante do tarde demais.


Que o maior hino ao amor seja percebê-lo e notá-lo ao nosso redor, sempre renovado e cheio de frescor, levando-nos a viver não um hino ao amor póstumo, mas viver indo ao amor.


(Muito obrigado se você chegou até aqui. Também tenho livros publicados. Recentemente, lancei “Carioba - As Tramas do Algodão”, Editora Oito e Meio. Disponível na www.amazon.com.br. Trata-se de uma ficção histórica sobre Carioba, uma vila operária que existiu em Americana SP, no início do século 20. Os personagens de Carioba, entre tantas situações na relação com a fábrica que sustenta o local, vivem também o amor em suas múltiplas formas. Vivem o amor testado nos limites de outros desejos. Ficarei honrado com sua leitura e sua avaliação).

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