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O sonho de ser escritor

No post anterior eu dizia sobre a coragem de ser escritor. Relatei experiências de julgamento sobre o que escrevi em meu primeiro livro e a dificuldade em enfrentar e assimilar esses comentários, muitas vezes cheios de coragem e boa intenção, mas que não deixam de nos paralisar por uns segundos ou décadas.


Naquela semana em que eu escrevia sobre essa coragem de me expor enquanto escritor, ocorreu o lançamento do Carioba - As Tramas do Algodão, meu quarto livro publicado e o meu segundo em que eu fiz um lançamento.


Para minha alegria, dezenas de pessoas queridas estiveram presentes, amigos de infância, do trabalho, familiares, amigos feitos durante a vida e até pessoas que eu conheci naquela noite. Fiquei por cerca de duas horas autografando e agradecendo a presença de todos eles. Foi tudo muito bom e inesquecível. Cheguei a pensar que eu parecia um escritor de verdade.


De todos os medos e receios que me assombram enquanto escritor, o temor do lançamento é um dos que mais assustam. "E se não aparecer ninguém?" "E se a editora ficar frustrada?" "E se chover no dia?" "E se... e se...?"


Não só tudo foi muito bom, como no dia seguinte recebi inúmeras mensagens de pessoas se desculpando por não poderem estar presentes e pedindo para adquirir o livro. O primeiro lote de exemplares enviados pela editora, que eu esperava vender em alguns meses, se esgotou em cinco dias! E algumas breves avaliações iniciais da leitura já tenho recebido, todas muito carinhosas e motivadoras.


Seria esse o sonho do escritor?


Alguns dias após o lançamento, eu sonhei que estava em um juizado de pequenas causas e uma pessoa que tinha adquirido e lido o livro estava furiosa comigo, querendo devolver o livro porque ela pensava que iria ler uma história e encontrou outra que não imaginava. Dizia ter sido enganada e esfregava o livro na minha cara.

Para meu alívio, o juiz decidiu que a pessoa poderia devolver o livro, mas que eu não precisava devolver o dinheiro. Eu fiquei aliviado, a pessoa foi embora muito brava e eu ainda pensei no meu sonho: "pelo menos vou poder vender esse livro de novo".


Esse é um tipo de sonho que revela nossas inseguranças e fraquezas, com certeza. Receios que precisam ser ainda trabalhados em meu interior, aprendizados que preciso desenvolver, situações a que tenho que me acostumar. Porém, algumas das primeiras avaliações sobre o que meus leitores já têm feito revelam, talvez, um lado desse sonho de ser escritor.


Uma pessoa muito querida agradeceu porque uma das personagens a fez se lembrar dela e de sua irmã do tempo em que trabalhavam na tecelagem do pai na espuladeira. Outra, se encantou pela prosa e pelos personagens que já pareciam ser da família. Outro, mais crítico, ao receber o livro correu dizer: "Quero ver se você enfrentou algumas verdades sobre aquele lugar que ninguém tem coragem de fazer".


Nestas pequenas manifestações, o leitor vai demonstrando que é ele quem faz a história. É ele quem dela se apropria. É ele quem tira suas conclusões. É ele quem vai se emocionar, chorar, se alegrar, sentir indiferença com o livro. O sonho do escritor passa não mais o de escrever, mas o de emocionar o leitor.


O sonho pode ser o de vender centenas de livros, de ver o seu livro em uma livraria importante, em ganhar prêmios, menções, etc. Mas, mesmo que nada disso aconteça, receber uma avaliação, um comentário, bom ou crítico, de um leitor é a verdadeira realização do sonho de ser escritor. Ver que sua história não passa indiferente pelo leitor, seja um, dois ou alguns. Saber que sua história assume caminhos e desperta memórias, lembranças e emoções que você nem imaginou ao escrever.


O sonho do escritor passa não mais em publicar. Mas em ser lido. Mais que isso, em fazer com que o livro que foi escrito se torne tão vivo que, em um plot twist, não mais o leitor leia o livro, mas o livro passe a ler o leitor. Muito se aprende, em cursos de técnicas literárias, em se deixar duas mensagens no texto: a mensagem visível e a mensagem profunda, não escrita. Conseguir produzir esse efeito já exige muito trabalho e dedicação.


Mas, tenho lido que existe uma terceira mensagem: aquela que a história faz ao coração do leitor. Quando o leitor se envolve na trama, quando a história desperta emoções, quando ele se vê naquele cenário criado, quando ele acha que aquela história foi escrita para ele, quando suas virtudes e defeitos se revelam no texto e o leitor se incomoda, se emociona, se questiona, faz suas reflexões próprias, tira lições e conclusões para a própria vida. Quando adquire valores de aprendizados, de sentimentos, de acalentos, impressões que apenas uma viagem literária pode oferecer.


Nessa hora, o livro que lê o leitor pode ser um bom sonho para o escritor. Ou o próximo sonho desse ofício que é procurar entender o mundo e as pessoas.





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